27.7.10

Silêncio
(Ânima)

Maia

O bem e o mal residem em nós,
seus conflitos provocam medo,
mas no degredo se constata:
A alma mesmo calada...
é uma voz.
Se a mudez for desespero,
se o novelo com que me embaraço
não tiver mais fio da meada,
ainda assim a alma é uma voz.
Mesmo que o tempo conspire
e todos à volta pareçam tão firmes,
intactos, inabaláveis.
Mesmo que a correnteza me arraste,
o vento carregue a bruma
e revele a forma do meu algoz...
É fato
que nada muda...
A alma mesmo calada
continua sendo uma voz.

14.7.10

Onze contra onze
(o jogo só termina quando acaba)

Maia

Mamãe, quero ser um punk
um rapper, um raper, um poser...
fingir a perfeição do requiem do anjo Mozart,
ou a plástica dos gols do zagueiro Mozer...
Sair bem na foto!
Quero só mais uma dose.
Depressa!... Tranga-me doze,
cada uma de uma cor.
O remédio para passar a dor
foi a compaixão da pessoa errada...
Dieta macrobiótica,
de ervas envenenadas
por beijos da namorada,
bastou para me livrar do peso.
Surpresa, quase fui preso...
Meu falo saiu ileso,
meu felling, quase intacto....
Batida de alto impacto,
cachaça, mel e limão,
selou esse novo pacto.
Novo contrato
firmando o ato
de um sujeito abstrato,
sujeito a pagar o pato
e comer o pão...
Mamãe me dê um irmão
que possa assumir a culpa.
Eu quero fugir pra Cuba,
fazer suruba,
comer jujuba,
tosar a juba,
fazer uma plástica
e ir pra ginástica na acadêmia.
Curar minha anemia,
carpir o dia
e morrer como morreu Saramago...
Os olhos fitos no teto num gesto vago,
a lamber sabão e arrotar bolhas de espuma.
Anjos e Demônios

(Gosto não se discute)

Maia


Eu gosto de ver as pessoas andando na rua,
de observar a pressa do mundo
e não fazer parte dela.

Gosto de ver as coisas sendo...
Gosto de ver o tempo escorrendo lento
na velocidade do pensamento vivo.

Eu gosto de ver o dia nascer.
Gosto de vê-lo morrer nas madrugadas.
De dormir entre uma coisa e outra.


Gosto da noite,
dos anjos e demônios que a habitam,
"la petit mort" morte em seu leito.

Eu gosto enfim da perfeita harmonia
do final feliz no fim da estória,
repleto de glórias, odes e luzes
e dos créditos que sobem ligeiros.

9.7.10

Príncipe Míchkin
(com o perdão de Fíodor)

Uma nuvem me segue
da boca do rio ao centro.
Com a janela fechada vejo a nuvem
mas não sinto o vento,
nem encontro o alento
de nova direção
O mundo também é o não
quando o talvez impera na vida...
Lambida de cão cura a ferida...
Mas meu gato e meu presente me arranham

Um pesadelo me desperta
quase toda madrugada
pelas janelas fechadas
vejo a luz da manhã
que não ilumina meus olhos...
Falta de um novo projeto
e a água escorre pelo teto,
pela alma e pelos canos
as dores se acumulam com os anos
e o doente está desenganado

Um grito me escapa,
quase espontaneamente,
todo dia...
Mas com a janela fechada
o som não sai
e me explode nos tímpanos.
A falta de melhor Juízo no tribunal da Bahia
paralisa os sentidos embotados pela apatia.
Com a falência do movimento sindical...
Deus é o Pleno!
Não deveria ser tão cruel...
E a coisa não poderia estar tão mal,
no Haiti,
para alguém se matar quando o Brasil perde uma copa...